quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Nietzsche x Pensamento Cristão

Resgatei esse tópico da Antiga Comunidade da Ringue Filosófico no Orkut. Deixem a sua opinião! :)



Nietzsche x Pensamento Cristão

Por: Frei Leo 

Irei expor aqui contraposição ao pensamento da professora Viviane Mosé inicialmente via um vídeo de Fr.Betto. Após isso, irei identificar o pensamento dos partícipes em seus posts anteriores a este, e depois filosofar uma nova proposta da quebra do pensamento de Nietzsche baseado na moral da fé cristã. 

 

Proposta de quebra do niilismo x fé cristã
Para Soren Kierkegaard , o homem e é um ser que se caracteriza pelo desespero que se origina das contradições de sua existência e de sua distancia de Deus: “o homem é um síntese de infinito e finito, de temporal e de eterno, de liberdade e necessidade”. Em sua obra “Estágios do Caminho da Vida” (1845), Kierkegaard formula uma doutrina de três níveis de consciência: O estético, no qual o individuo busca a felicidade no prazer, cuja fugacidade, entretanto leva ao desespero inevitável. O nível seguinte, o ético: em que procura alcançar a felicidade pelo cumprimento do dever, sendo, no entanto, condenado ao eterno arrependimento por suas faltas e falhas nessa tarefa, devido sua inconstância moral. Finalmente, o estágio religioso: em que o homem busca Deus, entretanto a verdadeira fé é a angustia da distância de Deus.

Nesses parâmetros parece que Kierkegaard esbarra no Deísmo, que é uma doutrina fundada na religião natural e que admitindo a existência de Deus, não enquanto Ele é conhecido por uma revelação ou por qualquer outro dogma, mas enquanto um ser supremo de atributos totalmente indeterminados. Este pressuposto fez Pascal mencionar que tal sistema de idéias seria apenas como um “Deus dos filósofos e sábios” – sendo, portanto, pernicioso para a religiosidade.

Seguindo nesse mesmo patamar, encontramos o nilismo (do latim nihil: nada), que é uma doutrina filosófica que nega a existência do absoluto, quer como verdade, quer como valor ético. Isto significa, que não há, para esta corrente, uma autoridade que é em si, independente de qualquer outra coisa, possuindo em si mesmo sua própria razão de ser, não comportando nenhum limite e sendo considerado independentemente de relação com um outro ser. 
Deste modo, a filosofia de Nietzsche tinha como tarefa libertar o homem dessa tradição da metafísica judaico-cristã, anunciando uma nova era, uma nova forma de pensar e agir através da transmutação de todos os valores. Se para Nietzsche, os valores do Cristianismo tolhem toda forma de vida criativa e espontânea de acordo com natureza humana, para os pensadores cristãos católicos essa não é a verdade. (Exclusivamente para os pensadores católicos, pois os protestantes e calvinistas aderem as idéias nilistas de forma indireta). “Pois, como diz Aristóteles, o intelecto, a sapiência e a ciência não se ocupam com coisas contingentes, mas das necessárias”. (São Tomás de Aquino – Summa Theologica –V I Ethic. lect. V)

Diante disso, a fé transcendente se faz necessária ao ser humano. É por meio dela que a razão se ilumina nesse intangível e inefável cognitivo daquilo que lhe é natureza própria. Onde a razão não enxerga caminhos, a fé faz uma estrada. Com isso, a fé uma atitude voluntária que tanto testemunha como presencia o sobrenatural. Nesse aspecto, da vontade, ocorre uma atitude concreta que consiste em ligar-se com algo que nós estamos comprometidos por uma confiança naquilo que ainda não vemos, não possuímos ou não temos experimentado, mas que é possível de ser ver, possuir e experimentar pela fé. (Hebreus 11,1)

Logo essa chamada virtude ou dom teologal da fé, gera outra virtude: a esperança. E essa virtude da esperança afasta o que Kierkegaard talhou como desespero por uma fé que é a angústia da distancia com Deus. A fé gera a esperança que aproxima de Deus cada indivíduo que deposita Nele não suas ilusões futuras, mas sim suas necessidades futuras e presentes.  

Em linguagem atual, dir-se-ia: a mensagem cristã não era só informativa, mas performativa. Significa isto que o Evangelho não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera fatos e muda a vida. A porta tenebrosa do tempo, do futuro, foi aberta de par em par. Quem tem esperança, vive diversamente; foi-lhe dada uma vida nova.

Devemos voltar, uma vez mais, ao Novo Testamento. No décimo primeiro capítulo da Carta aos Hebreus (verso 1), encontra-se, por assim dizer, uma certa definição da fé que entrelaça estreitamente esta virtude com a esperança. À volta da palavra central desta frase começou a gerar-se desde a Reforma, uma discussão entre os exegetas, mas que parece hoje encaminhar-se para uma interpretação comum.

Por enquanto, deixo o termo em questão sem traduzir. A frase soa, pois, assim: “A fé é hypostasis das coisas que se esperam; prova das coisas que não se vêem”. Para os Padres e para os teólogos da Idade Média era claro que a palavra grega hypostasis devia ser traduzida em latim pelo termo substantia. De fato, a tradução latina do texto, feita na Igreja antiga, diz: “Est autem fides sperandarum substantia rerum, argumentum non apparentium – a fé é a “substância” das coisas que se esperam; a prova das coisas que não se vêem”.

Tomás de Aquino, servindo-se da terminologia da tradição filosófica em que se encontra, explica: a fé é um “habitus”, ou seja, uma predisposição constante do espírito, em virtude do qual a vida eterna tem início em nós e a razão é levada a consentir naquilo que não vê. (Summa Theologiae, II-IIae, q. 4, a. 1). Deste modo, o conceito de “substância” é modificado para significar que pela fé, de forma incoativa – poderíamos dizer em gérmen e portanto segundo a “substância” – já estão presentes em nós as coisas que se esperam: a totalidade, a vida verdadeira. 
E precisamente porque a coisa em si já está presente, esta presença daquilo que há-de vir cria também certeza: esta coisa que deve vir ainda não é visível no mundo externo (não aparece), mas pelo fato de a trazermos, como realidade incoativa e dinâmica dentro de nós, surge já agora uma certa percepção dela.

Para Lutero, que não nutria muita simpatia pela Carta aos Hebreus em si própria, o conceito de “substância”, no contexto da sua visão da fé, nada significava. Por isso, interpretou o termo hipóstase/substância não no sentido objetivo (de realidade presente em nós), mas no subjetivo, isto é, como expressão de uma atitude interior e, consequentemente, teve naturalmente de entender também o termo argumentum como uma disposição do sujeito.

No século XX, esta interpretação impôs-se também na exegese católica – pelo menos na Alemanha – de modo que a tradução ecuménica em alemão do Novo Testamento, aprovada pelos Bispos diz: “Glaube aber ist: Feststehen in dem, was man erhofft, Überzeugtsein von dem, was man nicht sieht” (fé é: permanecer firmes naquilo que se espera, estar convencidos daquilo que não se vê).

Em si mesmo, isto não está errado; mas não é o sentido do texto, porque o termo grego usado (elenchos) não tem o valor subjetivo de convicção, mas o valor objetivo de prova. Com razão, pois, a recente exegese protestante chegou a uma convicção diversa: “Agora, porém, já não restam dúvidas de que esta interpretação protestante, tida como clássica, é insustentável”. (H. Köster)

A fé não é só uma inclinação da pessoa para realidades que hão-de vir, mas estão ainda totalmente ausentes; ela dá-nos algo. Dá-nos já agora algo da realidade esperada, e esta realidade presente constitui para nós uma prova das coisas que ainda não se vêem. Ela atrai o futuro para dentro do presente, de modo que aquele já não é o puro ainda-não. O fato de este futuro existir, muda o presente; o presente é tocado pela realidade futura, e assim as coisas futuras derramam-se naquelas presentes e as presentes nas futuras.  

Esta explicação fica ainda mais reforçada e aplicada à vida concreta, se considerarmos o versículo 34 do décimo capítulo da Carta aos Hebreus que, sob o aspecto da língua e do conteúdo, tem a ver com esta definição de uma fé perpassada de esperança e prepara-a.

No texto, o autor fala aos crentes que viveram a experiência da perseguição, dizendo-lhes: “Não só vos compadecestes dos encarcerados, mas aceitastes com alegria a confiscação dos vossos bens (hyparchonton – Vg: bonorum), sabendo que possuís uma riqueza melhor (hyparxin – Vg: substantiam) e imperecível” Hyparchonta são as propriedades, aquilo que na vida terrena constitui a sustentação, precisamente a base, a “substância” da qual se necessita para viver.

Esta substância, a segurança normal para a vida, foi tirada aos cristãos durante a perseguição. Eles suportaram-no, porque em todo o caso consideravam transcurável esta substância material. Podiam prescindir dela, porque tinham achado uma base melhor para a sua existência – uma base que permanece e que ninguém lhes pode tirar.

Não é possível deixar de ver a ligação existente entre estas duas espécies de substância, entre a sustentação ou base material e a afirmação da fé como base, como substância que permanece.

A fé confere à vida uma nova base, um novo fundamento, sobre o qual o homem se pode apoiar, e consequentemente, o fundamento habitual, ou seja, a confiança na riqueza material, relativiza-se.

Cria-se uma nova liberdade diante deste fundamento da vida que só aparentemente é capaz de sustentar, embora o seu significado normal não seja certamente negado com isso.

Esta nova liberdade, a consciência da nova substância que nos foi dada, ficou patente no martírio, quando as pessoas se opuseram à prepotência da ideologia e dos seus órgãos políticos e, com a sua morte, renovaram o mundo. 
Mas não é só no martírio… Aquela manifestou-se sobretudo nas grandes renúncias a começar dos monges da antiguidade até Francisco de Assis e às pessoas do nosso tempo que, nos Institutos e Movimentos religiosos atuais, deixaram tudo para levar aos homens a fé e o amor de Cristo, para ajudar as pessoas que sofrem no corpo e na alma.

Aqui a nova substância confirmou-se realmente como a substância da esperança destas pessoas tocadas por Cristo brotou esperança para outros que viviam na escuridão e sem esperança. Ficou demonstrado que esta nova vida possui realmente substância e é “substância” que suscita vida para os outros.

Para nós, que vemos tais figuras, este seu atuar e viver é, de fato, uma prova de que as coisas futuras, ou seja, a promessa de Cristo não é uma realidade apenas esperada, mas uma verdadeira presença: Ele é realmente o filósofo e o pastor que nos indica o que seja e onde está a vida.

Para compreender mais profundamente esta reflexão sobre as duas espécies de substâncias – hypostasis e hyparchonta – e sobre as duas maneiras de viver que com elas se exprimem, devemos refletir ainda brevemente sobre duas palavras referentes ao assunto, que se encontram no décimo capítulo da Carta aos Hebreus.

Trata-se das palavras hypomone (10,36) e hypostole (10,39). Hypomone traduz-se normalmente por paciência, perseverança, constância. Este saber esperar, suportando pacientemente as provas, é necessário para o crente poder “obter as coisas prometidas” (10,36).

Na religiosidade do antigo judaísmo, esta palavra era usada expressamente para a espera de Deus, característica de Israel, para este perseverar na fidelidade a Deus, na base da certeza da Aliança, num mundo que contradiz a Deus. Sendo assim, a palavra indica uma esperança vivida, uma vida baseada na certeza da esperança. No Novo Testamento, esta espera de Deus, este estar da parte de Deus assume um novo significado: é que em Cristo, Deus manifestou-Se.